Eu tinha medo de senti-lo.
Numa total incoerência, a coisa mais inesperada aconteceu de forma planejada. Não um plano maléfico, arquitetado. Mas um desejo latente de alguns meses subitamente transformado em impulso. Em urgência. Como se o medo de sentir estivesse pouco a pouco sendo substituído por um medo ainda maior: o de não poder sentir.
Eu agi por medo.
Medo porque, até aquele momento, as coisas aconteceram de um modo meio doido, meio mágico. Até aquele momento, eu não esperava que as coisas dependessem do cheiro. Neurótica que sou, já tinha antecipado mil vezes aquele fim, e em todos a culpa era minha. Se algo desse errado, era eu. Eu era errada. Eu não era certa.
Mas, naquele momento, eu era.
Foi um momento construído com os elementos mais dramáticos possíveis. Uma quase conspiração universal contra nós. Parecia que o momento não chegaria nunca. Parecia que a distância nunca diminuiria. O relógio corria preguiçoso, pois não era dele a pressa.
Chegamos aqui.
Por um instante, respirei fundo. Contei os passos, evitando assim cair com o nervosismo. Senti o vento gelado no rosto assim que passei pela porta, mas já não via mais nada pela frente. A chuva começava a cair e eu só pensava em seguir em frente. Estendi o braço.
Senti.
E naquele momento, não havia chuva, não havia medo, não havia cansaço. Só um abraço quente, em meio à noite fria, e a sensação iminente de que tudo valera a pena. Poucas palavras, minutos que duraram horas, e eu ainda sinto aquela mão quente segurando a minha e me levando para longe dos sons, das pessoas, do frio, e da chuva.
***
Às vezes, quando me sinto sozinha, sinto o teu cheiro, tal qual senti na primeira vez em que te abracei. Dói, mas eu carrego comigo, porque é a parte de ti que sempre me acompanha.